11 de ago. de 2013

Revelar

          Quis ouvir sua voz. Quis ouvir por engano. Mas, ao ouvir sua voz, lembrei que é nos pequenos enganos que o amor se acerta com a gente. Ao notar que era sua voz (eu), e ao notar que era a minha voz (você), tanto você quanto eu ficamos mudos, o que nos fez perder o sentido (o telefone) e os sentidos (nós). Sem sentido e sem sentidos, lembra, procurei mover aquele imprevisível desencontro possível, com uma fala:
          - Queria te ver. Hoje.
         Não saberia calcular, em segundos, quanto tempo leva para que a razão se apodere de nós, tão fria e calculista, enumerando (a razão faz listas) motivos para que você dissesse que não, que não poderia e (mais uma vez a razão faria uma lista) que havia um compromisso relevante pela manhã, o curso à noite, a terapia à tarde, o almoço com seu namorado ali perto mesmo do trabalho, havia esquecido que vocês trabalhavam juntos e (a razão é boa de listas) que, além de tudo isso, esse inverno e essa garganta não eram amigos e que sair, assim, você nem foi preparada para esse frio, que cidade é essa que pega a gente de surpresa e, honestamente, finalmente, respirou fundo e disse, fui pega de surpresa, desculpe, não vou.
          Oito horas depois, além de faltar ao encontro no almoço, perder a terapia, não ir ao curso e desmerecer toda aquela lista razoável, você estava linda, dormindo profundamente do jeito que só você dorme profundamente. Estava arrepiada - aproveitei para cobrir de beijos e lençóis cada parte do seu corpo. Preparei um café, acendi um cigarro, voltei, olhei novamente. Peguei a câmera na mochila, fixei-a no tripé. Prometi a mim mesmo que, quando você despertasse, faria a primeira fotografia do resto de nossas vidas.

Texto escrito pelo escritor Pedro Fonseca para a revista ELLE de agosto de 2013. Pelo projeto Loja de Histórias.

Gostei um bocado desse texto que encontrei folheando minha revista. O Pedro sempre acaba me surpreendendo com alguns parágrafos ou frases. Possivelmente trarei mais textos dele para cá :)

xx


2 comentários:

  1. Que texto mais lindim *-*
    Consegui imaginar toda a agonia que ele sentiu ao convidar a moça para sair. Ai ai, como a mãe da minha amiga disse hoje mesmo: "o amor é uma coisa tão linda! Falta ar, razão e senso para perceber que poderemos amar mais vezes na vida". Gostei muito da narrativa e eu me apaixonei por ele quando ele pegou a câmera e o tripé (muito sensível da parte dele, haha).

    Eu não sei se você costuma responder esse tipo de tag, mas eu indiquei o seu blog ok? Se quiser ver é só clicar aqui (selinho e meme). Tudo bem se não participar :3

    xoxo, Nicolle
    Dias e Flores

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  2. Só esqueci de comentar: Amo o trabalho da Francine <3

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